domingo, 17 de agosto de 2008

Imprensa, futebol e nativismo.

No dia primeiro de junho, a imprensa brasileira fez duzentos anos. Chegou tarde; o México já possuía uma desde 1535. Nada, pois, a agradecer a sua Majestade D. João VI. Assim pensava Hipólito da Costa, idealizador e editor de o “Correio Braziliense”, mensário publicado na Inglaterra e que circulou no Brasil de 01 de junho de 1808 a dezembro de 1822. Não há o que agradecer, mas há o que comemorar. Entre erros e acertos, grandezas e fraquezas, o saldo é prá lá de positivo. Imprensa e Parlamento são almas gêmeas na conquista e na manutenção da liberdade. Não foi diferente com a imprensa brasileira. Curiosamente, neste dia emblemático, setores da imprensa brasileira esquecem que este I de imprensa é o mesmo I de imparcialidade. Refiro-me ao tratamento dado aos lamentáveis episódios ocorridos no jogo entre o Náutico e Botafogo, mais especificamente, nos programas “Troca de passes” (domingo) e no “Bem, amigos” (segunda-feira), ambos do canal Sport TV.
No domingo, foi menos. Registrem-se o piti de Telmo Zanini e a injustificada participação dos Srs. Wanderley Luxemburgo e Abel Braga que, em relação ao episódio, somente tinham em comum o “chocolate” que levaram do Sport na Copa do Brasil. Deram uma colher de chá ao Presidente da Federação e ao Presidente do Náutico. Um faz-de-conta de direito de resposta. Mas o clima estava preparado para demonstrar a insegurança em Pernambuco, a truculência da polícia e vitimizar o Botafogo. Para tanto, sua excelência os fatos foram devidamente manipulados e, no “Bem, amigos”, escandalosamente distorcidos e desequilibradamente mostrados ao país. Jogaram na cesta do lixo os singelos mandamentos do bom jornalismo. Ouviu-se uma parte, uma versão – a do Presidente do Botafogo com direito a uma babosa paparicagem – a tal ponto que o Sr. Galvão Bueno estranhou a edição da fala (menos de trinta segundos) do Presidente da Federação Pernambucana. Assegurar a igualdade de espaço às partes envolvidas numa reportagem está para o jornalismo como o sagrado princípio do contraditório está para o direito. Hipólito da Costa está dando voltas no túmulo. A parcialidade (sem essa de visão conspiratória) é escancarada. A rigor, três fatos permeiam os acontecimentos: 1. FATO CONSENSUAL: o desequilíbrio emocional do jogador André. Está registrado nas imagens e no desfecho processual do caso. O desequilíbrio levou o atleta a disparar suas angústias em todas as direções (companheiros de equipe, juiz, auxiliar, adversários, torcida e policiais). Atitude grave porque contribui para o contágio, fenômeno de massas, que estimula sentimentos e emoções de toda ordem nas praças de esportes (alegria. tristeza, frustração, exaltação, violência), contágio que vem do campo para as arquibancadas e das arquibancadas para o campo. O atleta não é marginal, foi coro dos jornalistas. Em princípio, ninguém o é. No entanto, comportou-se como tal. Fez-se transgressor de vários códigos. Foi expulso e preso. 2. FATO POLÊMICO: a ação da polícia. E que será sempre polêmica aqui e alhures. A razão é simples: toda polícia exerce o legítimo monopólio da força, elemento constitutivo do Estado, para assegurar a paz social. O limite entre o uso e o abuso desta força é tênue. Será sempre discutível, discutida e deverá ser punida pelos excessos. No caso da Polícia Militar de Pernambuco dou meu testemunho na condição de autoridade pública quando exerci as funções de Governador e Vice-Governador: sob meu comando, em momentos de grave tensão, a corporação cumpriu de modo exemplar o seu dever. 3. FATO INUSITADO: a imediata ameaça de representação de Sua Excelência, Paulo Schmitt, procurador do STJD, responsabilizando o Clube Náutico Capibaribe pelos incidentes. Se o Estádio dos Aflitos “faz jus ao nome”, como ironizou, estou autorizado a supor que o seu sobrenome Schmitt faz jus à sua ancestralidade nazista, Herr Führer Paulo. Este senhor foi extemporâneo. A pressurosa celebridade deitou falação sem a cautela aconselhável aos guardiões da lei. E o que é pior, usando frase de efeito: ‘o excesso de segurança gera insegurança’. O que significa ‘excesso de segurança’? O que o senhor entende de gestão de segurança, em especial, nos eventos de massa? Em seguida, alegou que “é preciso encontrar um responsável”. A pergunta é: como responsabilizar o clube que não tem poder de comando, não define táticas e estratégias, enfim, não tem a voz da autoridade, como pode ter o ônus da responsabilidade? A se concretizar a punição, o Náutico, será o único caso na história universal em que a torcida (bem comportada) é moralmente afrontada, leva “dedadas” e ‘garrafada’ do jogador e o clube é penalizado. Aprendi a lição: vou vestir definitivamente a camisa azul e branca do meu Estado; vou colocar o sentimento nativista acima da rivalidade clubística; prefiro sofrer a gozação dos meus adversários à discriminação arrogante de compatriotas aos quais respondo com a verticalidade pernambucana do “mandacaru que dá a vitalícia banana/a todos que do sul/olham-no do alto da mandância” (João Cabral em “Pernambuco em mapa”).


Por Gustavo Krause.

Um comentário:

Brisa disse...

Perfeito o texto!

"...Um OLHO vê a 'truculência' da Polícia Pernambucana ao
prender um indivíduo (igual a outro qualquer), após
desrespeitar várias leis (gestos obscenos, agressão, etc.).
O OUTRO OLHO é cego para enxergar a mesma 'truculência'
quando no Morumbi um jogador argentino foi algemado e preso
ainda no estádio.
...Um OLHO se abre para criticar o Estado de Pernambuco, seus
Estádios de Futebol (onde se diga nunca houve mortes por
brigas de torcidas), e seus Clubes.
O OUTRO OLHO fica cego e não se lembra das mortes de
torcedores em estádios do sudeste e do sul.

Um OLHO se abre de PRECONCEITO.
O OUTRO OLHO se fecha de VERGONHA".

Extraido do Texto UM PAÍS DE CAOLHOS, de autoria de
Marcelo Brito Carneiro Leão.

PARABÉNS LÚCIA, PELA ATITUDE DE CORAGEM NO CUMPRIMENTO DE SUAS OBRIGAÇÕES!

"...Nova Roma de bravos guerreiros
Pernambuco, imortal, Imortal..."

Um abraço,
Luíza Roberta.